Pode não ser para mais ninguém, mas este texto tem significado histórico para mim. Seu sumaríssimo título original, espremido em uma coluna, era “Deputados esclarecem”.
Esta foi a primeira vez que o jovem repórter de 21 anos penetrou num clube fechado, o cenáculo dos comentaristas políticos da imprensa brasileira, escrevendo um texto para a seção internamente conhecida como “Destaque” do Estadão, em cuja sucursal de Brasília eu trabalhava.
Sem aparecer ao público com este nome, foi, durante décadas, uma coluna de informações de bastidores e comentários políticos publicada na nobre página 3 dos editoriais: um texto oriundo do Rio, outro de Brasília.
Os de Brasília tinham como titular o grande jornalista Evandro Carlos de Andrade, daí a responsabilidade em substituí-lo quando necessário. Os do Rio cabiam a uma legenda do jornalismo político, Villas-Boas Corrêa, e a outro excelente comentarista, Antonio Carbone, que se revezavam.
Jamais foi assinado — quando muito, nos anos finais em que existiu, levava como crédito as iniciais do autor. Eu, porém, já deixara o Estadão.
BRASÍLIA, 24 – Negam os srs. Amaral Peixoto [MDB-RJ] e Martins Rodrigues [MDB-CE] que tenham, algum dia, defendido a vinculação total do voto, contestando, assim, o que lhes foi atribuído pelo senador Felinto Muller [ARENA-MT]. O que [os dois deputados] defenderam, há tempos, dizem, foi o voto por legenda, o que é outra coisa e só tinha sentido quando havia partidos políticos, o que hoje não ocorre.
Tratava-se, então, de permitir que o eleitor assinalasse na cédula apenas a sigla do partido, passando seu voto a ser contado em favor dos candidatos majoritários desse partido, somando-se à legenda para o voto proporcional.
Atualmente – acentua o sr. Amaral Peixoto – não existem partidos, pois nem a ARENA nem o MDB podem ser assim considerados. Consequentemente, não há como pretender que o eleitor fique obrigado à fidelidade partidária, pois não lhe é oferecido objetivo para essa fidelidade. [O voto vinculado consistiria em obrigar o leitor, sob pena de nulidade, a votar de algo abaixo em todos os candidatos do mesmo partido. Na prática, beneficiava a ARENA, partido do governo militar, para onde acorreram políticos de todos os lados quando foram extintos os partidos polítidos tradicionais, com o PSD original, a UDN e PTB original, em 1965).
O caso ainda se agrava com a existência da sublegenda.
[As sublegendas eram subpartidos que poderiam ser instituídos em cada Estado dentro dos dois únicos partidos autorizados para as eleições majoritárias. Na prática, destinavam-se a abrigar sob o mesmo guarda-chuva da ARENA, o partido do regime militar, as diferentes correntes oriundas das antigas legendas políticas, como PSD ou UDN, que continuavam ferrenhas adversárias entre si. A soma dos votos das sublegendas, porém, contavam, todas, como votos para a ARENA, beneficiando só o governo, já que a oposição mal conseguia ter um único candidato em muitos casos].
Pois são numerosas as circunstâncias em que os conflitos internos da ARENA, até mesmo de natureza doutrinária, são muito mais aprofundados do que os que separam certas facções da ARENA e do MDB.
Os exemplos são citados: em Mato Grosso, pode considerar-se coerente um voto dado a candidatos da ARENA-1 “ex-udenista” e da ARENA-2 “ex-pessedista”, quando um e outro se atritam em nível que envolve a própria permanência do governador do Estado no cargo?
E no Rio Grande do Norte? Não será mais estranho lançar na mesma cédula candidatos da ARENA e do [adversário] MDB do que arenistas fiéis ao senhor Dinarte Mariz e arenistas fiéis ao sr. Aloysio Alves? [as duas correntes rivais que se odeiam?].
Redação final
A Comissão Especial de reforma da ARENA estará reunida amanhã, sob a presidência do senador Carvalho Pinto [SP] para discutir a redação final do anteprojeto do programa do partido, elaborada pelo deputado Djalma Marinho [RN], relator geral. Na mesma oportunidade deverá ser aprovado o anteprojeto dos estatutos, elaborado pelos deputados Arnaldo Cerdeira [SP] e Ruy Santos [BA] e revisto pelo sr. Djalma Marinho.
Não modifica
O senador Carvalho Pinto informou que a Comissão se limitará a discutir a redação do anteprojeto do programa, sem modificações de conteúdo. Deverá, assim, ser mantido o dispositivo segundo o qual a ARENA lutará por eleições diretas, “tão logo as condições sociais, políticas e econômicas do País o permitam”.
Seu reexame, se ocorrer, será de iniciativa do Gabinete Executivo do partido, antes de remeter a matéria à convenção nacional, ou partirá da própria convenção.

Convenção
A ARENA da Guanabara está estudando a possibilidade de requerer à direção do partido o adiamento da convenção nacional para o próximo ano. Uma das razões é a pouca repercussão que a reunião terá, devido à proximidade do recesso parlamentar.
Prorrogação
O líder do MDB na Câmara, deputado Mário Covas [SP], disse hoje que não vê possibilidade do partido ser favorável à prorrogação de mandatos de prefeito de capitais, uma vez que isso contraria os princípios e o programa da oposição.
Disse que o problema não deve ser discutido tendo em vista este ou aquele caso concreto, mas em tese, e que assim o MDB é contrário, embora o assunto ainda não tenha sido examinado pelo partido.
A prorrogação de mandatos de prefeito é repelida pela maioria dos membros da bancada paulista do MDB. Os parlamentares da ARENA, contudo, mantêm atitude de reserva, pois a liderança governista ainda não expediu instruções a respeito. O projeto que autoriza prorrogação dos mandatos, de autoria do deputado Cardoso Alves (ARENA-SP) encontra-se na Comissão de Justiça da Câmara, aguardando parecer.
Parlamentares oposicionistas, de outros Estados, também se manifestaram contrariamente à prorrogação, tendo um deles – um dos coordenadores da Frente Ampla – afirmado que a dos prefeitos é tão ou mais antidemocrática do que a do ex-presidente Castelo Branco.
Memória de Ricardo Setti, de Brasília, publicada no jornal O Estado de S. Paulo a 27 de novembro de 1967, sob o título anódino de “Deutados esclarecem” (em segundo lugar na coluna reproduzida)