Nico Villiams, 21 anos, atacante da seleção espanhola: pais caminharam a pé no Saara para dar um futuro aos filhos (Foto: @fichajes.net) Foto: @Fichages.net

O atacante Nico Williams, a grande revelação da Eurocopa pela seleção da Espanha junto a seu companheiro de clube Lamine Yamal, estava sendo disputado a tapas por vários gigantes do futebol europeu antes mesmo de terminar a copa europeia de seleções. O Chelsea e o Arsenal, ingleses, e o Barcelona, entre outros clubes, estão no páreo.

No rico futebol da Premier League, são tidos como até baratos os 58 milhões de euros da cláusula de rescisão de Nico com seu clube, o Athletic Bilbao, do País Basco, potência apenas mediana da Liga Espanhola. O Chelsea se dispõe a triplicar para 15 milhões de euros seu salário atual. O Arsenal negocia. E o Barça está financeiramente muito apertado, com uma dívida enorme e construindo um novo estádio para o qual lançou títulos no mercado no valor de 1,5 bilhão de euros, pelos quais pagará juros.

No centro de todas essas cifras está o jovem Nicholas Williams Arthuer, 22 anos, nascido em Pamplona, na região de Navarra, na Espanha, e irmão de Iñaki Williams, 30 anos, também atacante do Athletic. Os dois são filhos de pais que empreenderam uma aventura heróica para estabelecer-se na Espanha. Oriundos de Ghana, na África, Félix e Maria fugiram em 1964 de uma vida miserável pelas mãos de uma das muitas máfias que traficam imigrantes ilegais para a Europa.

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Os irmãos Nico (esq.) e Iñaki Williams com a mãe, Maria: heroísmo para que os filhos tivessem um futuro (Foto: @Iñaki Williams)

Amontoados na boleia de um caminhão, atravessaram o território da própria Ghana, depois Burkina Faso, Mali e Argélia. Num determinado ponto que o casal não pôde determinar, os traficantes de seres humanos mandaram todos descer do caminhão em pleno deserto. Calculam ter caminhado algumas centenas de quilômetros no inóspito e implacável deserto do Saara, viram companheiros morrerem no caminho até chegarem ao Marrocos. Ali, dirigiram-se para a cidade autônoma espanhola de Melilla, incrustrada na costa leste do Marrocos, conseguiram pular a cerca alta, de alambrado reforçado, que separa a cidade do território marroquino e foram presos pela polícia espanhola.

Seu destino seria a deportação para Ghana, mas um advogado da ONG católica Cáritas aconselhou-os a se livrarem dos papéis que tinham, dizer que haviam saído da Libéria, país convulsionado, na época em clima de guerra civil, e pedir asilo político na Espanha. Conseguiram. Passaram por Málaga, na Andaluzia, e por Madri, mas acabaram se fixando em Bilbao, no País Basco, onde um padre da Cáritas conseguiu para Félix um trabalho como pedreiro. Em homenagem ao religioso, o filho que Maria trazia na barriga, e que nasceu em Bilbao, recebeu seu nome.

O pai dos dois jogadores, Félix Williams, teve que viver nove anos na Inglaterra, longe da família, por ter obtido um bom emprego como encarregado de uma propriedade rural. Visitava mulher e filhos quando podia e tinha, como tem até hoje, problemas nos pés como herança da longa caminhada pelo Saara.

Nico chegou garoto ao Athletic seguindo os passos do irmão mais velho. Foi subindo de categoria e, ao chegar à equipe principal, onde estreou em abril 2021, aos 18 anos, foi se firmando até tornar-se titular absoluto, diferentemente do irmão, bom jogador mas não fora de série. Na recém-encerrada Eurocopa Nico foi apresentado ao mundo.

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5 Comentários

Marcio Valente em 23 de julho de 2024

Boa história, a do Nico. Que fase boa pra quem gosta de esportes: Copa América, a Euroca e agora a Olimpíada. Li que 237 atletas brasileiros vão de classe econômica pra Paris. Outros 40 vão de executiva porque têm mais de 1,92. 37 cartolas ( presidentes de federações esportivas)vão de executiva. Seria justo se usassem pra cartolagem, o mesmo critério para os atletas: grandões na executiva, medianos e baixinhos na econômica…

Marcio Valente em 23 de julho de 2024

Grande Nico Williams!! Esporte é o assunto do momento Copa América, Eurocopa e agora a Olimpíada. Aliás, sobre a Olimpíada, soube hoje que todos os 37 cartolas de federações esportivas vão de classe executiva para a Olimpíada de Paris. Os 237 atletas com menos de 1,92 vão de classe econômica e os 40 acima disso vão de executiva. Seria justo se, com a cartolagem, acontecesse a mesma coisa: os grandões de classe executiva e os outros de econômica. Os cartolas são incuráveis. Quem vai dar duro na Olimpíada, por definição, são os atletas. Os cartolas deveriam mesmo é viajar na classe econômica. Mas isso jamais vai acontecer, caro Márcio. Coisas do nosso país

Tim Teixeira em 20 de julho de 2024

Já conhecia alguns detalhes dessa saga, mas a história traz riqueza de informações e está muito bem escrita. Parabéns ao autor. Caro Tim, obrigado por visitar meu site e pelos comentários simpáticos sobre o texto. O site acabou de ir para o ar e há uma grande quantidade de material que ainda será publicado aos poucos -- tento comentários ou relatos sobre temas atuais, como foi o caso do posta respeito do Nico Williams, como material não perecível, atemporal, que fui acumulando ao longo da carreira. Portanto, volte sempre. Um abraço!

CARLOS NASCIMENTO em 17 de julho de 2024

Caro RS Os imigrantes estão tornando o futebol europeu quase que imbatível, era a "pitada de sal" que faltava, aliando estrutura ao talento nato que possuem. A final da Euro/24 evidenciou essa metamorfose, Espanha x Inglaterra fizeram uma final mágica. Pena que a Inglaterra ainda queira manter a velha tradição conservadora, utilizando técnicos (Southgate) por 8 anos, atrasando a revolução que já se faz necessária. Acabo de ler que Southgate caiu, vamos ver se a Federação Inglesa terá a coragem de quebrar os paradigmas e contratar um técnico revolucionário. O padrão Kane de ser, precisa de uma simbiose com saka.......KKKKKKKKKK

Ariani Carneiro em 15 de julho de 2024

Que bela história, Setti. Dessas tantas que ouvimos no esporte e nos emocionam. Esse menino é um fenômeno. E viva os imigrantes! Pois é, minha cara, o preconceito absurdo contra os imigrantes tromba com a realidade de que eles enriquecem extraordinariamente o país em que eles próprios ou seus antepassados se instalaram. Veja o colosso de contribuição que os imigrantes deram a Estados do Brasil como São Paulo, por exemplo. Ou o Paraná. Ou o Rio Grande e Santa Catarina. E assim por diante. No futebol europeu, em vários campeonatos a maioria dos grandes jogadores descende de imigrantes - às vezes do lado paterno, às vezes do materno, às vezes de ambos. As seleções da Espanha, da França, da Alemanha, da Holanda, da Suíça, da Áustria e de Portugal, entre outras, são exemplos disso, não é mesmo

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