
Que você, leitor, não tenha a menor dúvida: esta é a história de um dos brasileiros mais fascinantes deste e de outros séculos — o jornalista Assis Chateaubriand. Morto em 1968, aos 75 anos, ele foi o que os anglo-saxões chamam de kingmaker — um fazedor de reis.
Só isto, porém, está longe de defini-lo. Era um fazedor mas também um desfazedor de reis (e de reputações), com o detalhe de que às vezes, por uma mistura de birra, megalomania e molecagem, cismava de colocar a coroa na própria cabeça.
Nada mais natural para um sertanejo que, já garoto taludo, era analfabeto e andava descalço na caatinga, mas apenas duas décadas depois trovejava como um dos barões da imprensa do pais e antes da meia-idade possuía um império bilionário de comunicações e um poder de tal forma extenso que, mesmo no Brasil iníquo e absurdo de hoje, seria inimaginável.
Chantagista, crápula, escroque, patife, ladrão, tarado — de tudo o que se pode imaginar de ruim ele foi chamado (poucas vezes pela frente, é verdade) por críticos e inimigos. Mas palavras de alta octanagem como empreendedor, pioneiro, visionário, gênio e mecenas também se usaram, torrencialmente, para tentar defini-lo.
Como Fernando Morais mostra, em nenhum dos dois casos isso aconteceu por acaso. E é o esforço jornalístico para retratar, com equilíbrio e rigor, um personagem tão complexo que faz Chatô, o Rei do Brasil, uma obra superior ao já excelente Olga.
Sou daqueles que acreditam que a orelha de um livro jamais deve tirar do leitor o prazer de surpreender-se com o seu conteúdo. Assim, deixo, de propósito, de mencionar qualquer passagem das muitas imperdíveis deste livro.
Mas gostaria de discordar da comparação freqüentemente feita segundo a qual Chateaubriand seria uma espécie de Cidadão Kane brasileiro — para o bem e para o mal.
Você vai constatá-lo lendo o brilhante relato de Fernando Morais. Só que você vai fazer muito mais do que conhecer a biografia de um homem cheio de grandeza e miséria, paixão e fúria.
Você vai realizar, daqui a pouco, um denso, inquietante, às vezes assombroso mergulho na História contemporânea do Brasil.
(Orelha escrita por Ricardo Setti para o livro “Chatô, o Rei do Brasil”, de Fernando Morais, lançado em agosto de 1984 e um grande best-seller que continua no catálogo da editora Companhia das Letras e segue despertando o interesse dos leitores)