Linchado por seu próprio povo: assim morreu o ditador da Líbia, Mohammed Khadafi, em outubro de 2011. A imensa repulsa popular ao ditador Maduro na Venezuela, que está sendo reprimida a tiros, não pode ser ocultada por eleições roubadas como as de anteontem, 28 de julho de 2024. O destino de Maduro pode ser, um dia, o mesmo de Khadafi. Ou de Nicolae Ceausescu e sua mulher, Elena, no Natal de 1989 – linchamento depois disfarçado em “julgamento popular” seguido de fuzilamento.
Sem contar, olhando mais para trás, ditadores ou ex-ditadores latino-americanos que foram assassinados em atentados, como Rafael Leonidas Trujillo, da República Dominicana, em 1961, ou Anastasio Somoza, da Nicarágua, em 1980, já deposto no ano anterior pela revolução sandinista.
O repúdio e a censura internacionais à fraude colossal praticada pelo ditador da Venezuela estão sendo de uma itensidade como há tempos não se via: dos Estados Unidos a uma dezena de países latino-americanos, da União Europeia à OEA e à ONU. Muitos, mesmo o governo Lula em cima do muro, começam pedindo “transparência”, mas a condenação explícita não parece que vai cessar nos próximos dias.
Não é sem razão. A repressão já causou mortes e centenas de prisões de manifestantes, e também foi preso um dos principais dirigentes da oposição, Freddy Superlano, cordenador nacional do partido Voluntad Popular, uma das forças anti-Maduro.
Na Venezuela, riquíssima em petróleo, falta tudo depois de 25 anos de chavismo e de 11 anos com Maduro no poder – de medicamentos a papel higiênico -, a saúde e a educação públicas estão no chão, a violência da polícia e das milícias pró-governo mata pessoas sem que haja consequências, as cadeias estão lotadas de presos políticos, a tortura é normal como a respiração, e calcula-se que 5 milhões de venezuelanos deixaram o país fugindo dessa situação.
A maior fonte de recursos vem do petróleo, mas com a estatal PDVSA, sucateada e recheada de apaniguados do regime, a produção vem desabando: de 3,23 milhões de barris por dia em 2008, já sob o chavismo, caiu para 796 mil no ano passado. O país tem a maior reserva de petróleo do planeta -400 bilhões de barris, a maior parte na bacia do Rio Orenoco, coberta por densa floresta amazônica e, além disso, contendo um tipo de petróleo pesado que a estatal não tem recursos para extrair.
O sucateamento da estatal e a falta de técnicos levam não apenas à queda na produção, como a acidentes e derramamentos que poluem enormemente áreas em diferentes Estados do país.
Neste pós-eleição, no meio da rebelião nas ruas de várias cidades da Venezuela, o PT envergonhou o Brasil ao reconhecer nesta segunda-feira, 29, a “reeleição” de Maduro. Em nota, o partido “saúda o povo venezuelano pelo processo eleitoral” que — santo Deus! — qualifica como “uma jornada pacífica, democrática e soberana”. Em tom semelhante se manifestaram as ditaduras de Cuba e da Nicarágua, e dois gigantes internacionais “amigos” de Maduro, Rússia e China, que parabenizaram o ditador.
A política mais popular da Venezuela, Maria Corina Machado – impedida de concorrer por manobra do Judiciário dominado por Maduro – disse ter “como provar a verdade” sobre a roubalheira eleitoral e afirma que a eleição foi vencida pelo ex-diplomata Edmundo González Urrutia, candidato que a oposição unida conseguiu emplacar na última hora e para o qual pesquisas de opinião, mesmo não plenamente confiáveis na caótica Venezuela de hoje, atribuíam até 80% dos votos.
Maria Corina diz ter tido acesso a 73% das atas de apuração dos votos e, com base nelas, a projeção seria de uma vitória de Gonzáles com 6,2 milhões de votos, contra 2,7 de Maduro. Não se sabe como ela teria tido acesso às atas, inclusive porque a oposição e jornalistas independentes denunciaram que funcionários e militares do governo Maduro haviam sequestrado 40% dessas atas.
O Itamaraty, em tom bem melhor do que o do partido do governo, o PT, defendeu que a divulgação dos dados desagregados por mesa de votação é “passo indispensável para a transparência, credibilidade e legitimidade do resultado do pleito”.
No momento em que escrevo, Lula ainda não condenou nem defendeu Maduro, a quem havia aconselhado, dias antes da eleição:
— O Maduro precisa aprender que em eleição quem ganha fica [no poder], e quem perde vai embora.
O inevitável Celso Amorim, “assessor para assuntos internacionais” de Lula (de que serve o país ter um diplomata de carreira como chanceler?) foi enviado a Caracas e vai relatar ainda hoje ao presidente suas impressões. Não me surpreenderia absolutamente se Amorim desse seu aval para o resultado fraudado.