O ótimo Nexo Jornal, publicação cuja principal preocupação é tentar explicar o que está acontecendo e não simplesmente noticiá-lo — uma poderosa arma no Brasil para enfrentar fake news –, me pediu anos atrás (2016) cinco livros que haviam marcado em leituras recentes.
Compartilho aqui no site porque continuam me marcando. Livros de primeiríssima.
Veja só:
A Capital da Vertigem
Roberto Pompeu de Toledo
Esplêndida história de São Paulo entre 1900 e o ano do quarto centenário, 1954. Delícias como saber detalhes da chegada do primeiro automóvel à cidade ou conhecer as disputas por quem construía o edifício mais alto misturam-se a rebeliões sanguinárias, imigrantes tornados milionários e uma riquíssima galeria de personagens fascinantes, que vão de Mario de Andrade a Assis Chateaubriand, de Claude Lévy-Strauss a Cicillo Matarazzo. Texto informativo, soberbo e delicioso.
Getúlio
Lira Neto

Uma trilogia de 1.704 páginas que se lê de uma sentada. Com linguagem de jornalista e rigor de historiador, Lira Neto produziu um grande retrato do político mais marcante da história republicana. A leitura permite concluir que, diferentemente da imagem de “grande líder” e condutor de massas associada ao personagem, Getúlio era destituído de convicções profundas e se destacou mesmo foi pela capacidade oportunista de antever para onde sopraria o vento. Reforçou, em mim, a convicção de que seu papel na história foi, mais que tudo, nefasto.
Four Days in November – The Assassination of President John F. Kennedy
Vincent Bugliosi

A melhor reportagem que li na vida. O ex-promotor público Vincent Bugliosi passou 20 anos investigando o assassinato de Kennedy e entrevistou pessoalmente ao menos mil – sim, mil! – pessoas para fazer um implacável relato cronológico, incluindo frequentemente precisão de segundos, de cada momento transcorrido desde a chegada do presidente a Dallas até seu funeral. Sem querer provar nada de antemão, chega à conclusão, insofismável, de que não houve conspiração alguma no caso.
With the Old Breed – At Peleliu and Okinawa
Eugene B. Sledge

Santa Evita
Tomás Eloy Martínez

Meio ficção, meio realidade, este portentoso livro do escritor argentino (felizmente traduzido no Brasil) pinta com cores alucinantes, mas reais, a vida e a curta mas fulminante carreira pública da ex-atriz medíocre Maria Eva Duarte de Perón, a Evita Perón, a primeira-dama que se tornou semideusa no país vizinho em oito anos de convivência com o líder Juan Domingo Perón. Morta de câncer aos 33 anos em 1952, seus funerais mobilizaram dois milhões de pessoas e ela foi declarada, por lei, “chefa espiritual da nação”. Até Perón ser deposto, em 1955, houve campanhas por sua canonização e todo santo dia, às 20h25, as emissoras de rádio da Argentina eram obrigadas a lembrar tratar-se da hora em que Evita “passou para a imortalidade”.
O livro mostra que, no terreno do populismo, pode não haver limites para a insânia.
(Post de Ricardo Setti, de São Paulo, publicado originalmente no Nexo Jornal a 4 de setembro de 2016)