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Mario Covas: incoerências nos processos contra Márcio Moreira Alves e, agora, contra seu colega de bancada Hermano Alves (MDB-GB) (Foto: Fundação Mario Covas) (Foto: @Fundação Mario Covas)

Mario Covas, o líder da oposição, descobriu algumas incoerências do governo no conteúdo da denúncia contra Hermano Alves, que foi remetida à Câmara juntamente com o pedido de licença para processar o deputado carioca na Justiça Militar.

A primeira delas está logo na denúncia oferecida junto à 1ª. Auditoria da Marinha pelo procurador da Justiça Militar. No final do texto, o procurador, depois de indicar os dispositivos legais violados por Hermano, diz textualmente: “Cumpre assinalar ainda que o denunciado, acobertado por suas imunidades parlamentares, como deputado federal, usou da Tribuna do Parlamento, no caso a Câmara dos Deputados, para, através de vários discursos publicados no “Diário do Congresso” de 6 de fevereiro, de 2 de abril, de 10 de abril e de 22 de agosto do corrente ano, os quais também instruem a presente denúncia, infringir a Lei de Segurança Nacional, mas que não são trazidos à colação, em face da imunidade assegurada ao denunciado pelo artigo 34, “caput”, da Constituição Federal.

Ora, o procurador, diz Covas, reconhece que os pronunciamentos de Hermano, da tribuna, não podem constituir causa de procedimento judicial contra o deputado, em face de sua imunidade, assegurada na Constituição. Pois é justamente a tese oposta que o governo, pelo ministro da Justiça, defende no caso Márcio Moreira Alves. E tanto é assim que pediu a suspensão de seus direitos políticos por haver o deputado pronunciado discursos considerados ofensivos às Forças Armadas. Mesmo assim, como Hermano, esse mesmo governo, através agora do procurador da Justiça Militar, entende que o deputado não pode ser processado por seus discursos e o denuncia apenas pelos artigos que escreveu.

Há ainda outras incoerências que Covas viu no texto do processo contra Hermano.

Por exemplo: no ofício do general Jaime Portella ao ministro Gama e Silva, o chefe da Casa Militar e secretário-geral do Conselho de Segurança Nacional diz que “o cidadão em tela” (Hermano Alves) “vem pregando sistematicamente: 1) a desagregação das Forças Armadas; 2) o antagonismo entre as classes armadas e os civis; 3) a desmoralização da autoridade, quer através da pessoa do Excelentíssimo Senhor Presidente da República, quer dos seus ministros e auxiliares diretos; 4) subversão do regime”. Isso através do matutino carioca para o qual Hermano escreve. 

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Reprodução da matéria publicada © Reprodução

Mais adiante, contudo, o próprio general Portella salienta: “Na tribuna da Câmara dos Deputados, os pronunciamentos do deputado Hermano Alves confirmam suas atividades pela imprensa, conforme se verifica pelos anexos 8, 9, 10, 11 e 12”.  Isto é, o general Portella considera que também os discursos de Hermano pregaram sistematicamente “a desagregação das Forças Armadas, o antagonismo entre as classes armadas e civis, a subversão do regime” etcetera.

Ora, sendo assim, pergunta Mário Covas, por que não o denunciaram com base no mesmo dispositivo que serviu de denúncia contra Márcio Moreira Alves? Se Márcio não é considerado inviolável, no exercício do seu mandato, pelo governo, por que Hermano está sendo? Seus discursos não são subversivos também, segundo o governo?  Além disso, por que denunciaram Márcio pelo artigo 151 da Constituição e Hermano pela Lei de Segurança Nacional, se os crimes de que Hermano é acusado são mais graves do que o de Márcio?  Márcio é acusado de ter atacado as Forças Armadas. Hermano é acusado de uma série de crimes, inclusive da prática de “atos destinados à guerra revolucionária ou subversiva”, conforme o ministro Gama e Silva. 

Para Mário Covas, a explicação pode ser o fato de o próprio governo não estar bem certo da tese defendida pelo ministro Gama e Silva, segundo a qual a inviolabilidade do mandato parlamentar é relativa e não absoluta. Assim, no processo contra Hermano, o governo teria preferido ir pela via normal, considerando o mandato inviolável e denunciando-o apenas pelos artigos publicados num jornal carioca.

Por estas e outras é que o deputado Mário Covas é considerado, apesar de ser engenheiro, como tendo uma irresistível vocação jurídica.

(Artigo de Ricardo Setti, de Brasília, publicado a 23 de novembro de 1968 no Jornal da Tarde, de São Paulo, sob o título original de “Este processos são coerentes?”

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