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Durante cinco longos minutos, nessa segunda-feira 15 de novembro, a colossal superpotência soviética terá parado as suas máquinas e silenciado os seus 246,5 milhões de habitantes num tributo final a Leonid Ilyich Brejnev.

Morto na manhã da última quarta-feira, 10 de novembro de 1982, em Moscou, aos 76 anos incompletos, de ataque cardíaco, o líder soviético que durante quase duas décadas moldou as feições da URSS não poderia deixar de ter um funeral à altura do imponente cerimonial que a Revolução Russa, ao longo de seus 65 anos de existência, aprimorou para os seus filhos diletos. Incontestavelmente, Brejnev foi um deles – e a História o julgará não apenas pelo que fez em vida, como também pela forma inédita e surpreendente de sua sucessão.

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Uma das últimas fotos de Brejnev, durante solenidade na Praça Vermelha, acompanhado do marechal Dmitriy Ustinov, ministro da Defesa da URSS (Foto: @Agência Tass)

Não tendo nenhuma vocação para a alternância do poder, e dispondo de escassa experiência no ramo – desde 1917 apenas quatro homens comandaram a nação – a União Soviética ultrapassou com espantosa agilidade a temida barreira da sucessão imediata de Brejnev.

Menos de 24 horas após o anúncio oficial de sua morte, lido com 27 horas e meia de atraso pelo solene apresentador de TV Igor Kirillin, o mesmo que apresentou toda a programação da última Olímpiada de Moscou, Yuri Andropov, ex-chefe da KGB, a polícia política soviética, de 68 anos, virtual número 2 desde maio passado, já estava entronizado pelo Comitê Central como o novo secretário-geral do Partido Comunista da URSS, o principal dos cargos ocupados por Brejnev e do qual, para todos os efeitos, passa a comandar o país.

Já estava tudo resolvido antes de o líder morrer

Numa sessão secreta de emergência, realizada na sede esverdeada do CC, em Moscou, seus 318 membros elegeram Andropov por unanimidade, na manhã de sexta-feira, fazendo ruir, de quebra, uma tonelada de análises ocidentais sobre a difícil sucessão e a árdua luta pelo poder no Kremlin. Ademais, foi o pretenso grande rival de Andropov, Konstantin Chernenko, quem leu a nomeação formal no final da votação, acrescentando um toque de suposta harmonia partidária ao evento. Na verdade, já estava tudo resolvido antes mesmo de Brejnev morrer.

Quanto à segunda vaga deixada por Leonid Brejnev, que desde 1977 acumulava o cargo de presidente da URSS, parece haver menos pressa no Kremlin em ocupá-la, pois se trata de um cargo mais honorário, que jamais içou nenhum de seus ocupantes ao comando real da nação. Yuri Andropov poderá utilizá-lo como ponto de exílio ideal para algum de seus desafetos mais perigosos.

No próximo dia 23 de novembro, já com Andropov mais firme em sua cadeira, o Soviete Supremo deverá anunciar quem o novo líder escolheu para a chefia do Estado. Até o final da semana passada, além do mesmo Chernenko que perdeu o prêmio maior, estava sendo cotado o veterano ministro das Relações Exteriores, Andrei Gromyko, de 73 anos.

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A revista Time já saiu tendo na capa Yuri Andropov, sob a sombra de Brejnev (Ilustração: @Birney Lettick/Time) (Ilustração: @Birney Lettick/Time)

Assim, antes mesmo que o mundo se refizesse do susto pela morte de Brejnev, o poder na URSS já havia trocado de mãos. É possível, como ironizou o professor americano Victor Petrov, que a maior diferença entre Brejnev e Andropov seja a de que “o primeiro está morto e o segundo está vivo”, mas, ainda assim, inicia-se uma nova era na história da URSS.

Começa-se a viver ali, agora, uma espécie de ensaio do que inexoravelmente ocorrerá dentro de mais alguns anos, quando os últimos exemplares da gerontocracia formada no stalinismo e na guerra sairão de cena, cedendo o lugar, em nível nacional e regional, aos mais de 50% da população da geração seguinte. No entender do historiador polonês Seweryn Bialer, professor de Ciência Política da Universidade de Columbia, em Nova York, começará então a primeira sucessão real da história da União Soviética desde os anos 30, quando Stalin eliminou 1 milhão de companheiros do partido.

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