BRASÍLIA, 6 de junho de 1966 – A notícia da cassação do mandato e da suspensão dos direitos políticos do sr. Ademar de Barros foi recebida com euforia nos círculos mais pronunciadamente revolucionários da Capital. A medida, longamente esperada, segundo manifestaram os meios revolucionários, não causou surpresa, em vista dos últimos atos do ex-governador [de São Paulo]

[Os jornalistas do Estadão, nesta época, tinham que chamar de “revolucionários” os políticos ou militares que participaram do golpe de 1964, chamado de “Revolução” por seus responsáveis ou os que aderiram depois.]

Uma fonte militar comentou, a propósito, que o sr. Ademar de Barros “havia ultrapassado os últimos limites toleráveis para uma oposição ao governo federal, que foi gradualmente se transformando em atitude de insolente provocação, com repercussões negativas no próprio conceito do governo perante a opinião pública”. 

Comentou-se, também, a progressiva mudança no comportamento do improbus administrator [“administrador desonesto”, em latim, uma das formas pelas quais o Estadão tratava Adhemar, a quem sempre fez feroz oposição. Outra maneira era nunca referir-se a ele pelo nome completo, mas sim a “sr. A. de Barros”] no transcorrer dos últimos dois anos: logo após a Revolução de 31 de março, o sr. Ademar de Barros manteve-se em atitude de expectativa para, passo a passo, atingir a grande corrupção que, nos últimos dias, vinha marcando sua administração, em seguida à decretação do Ato Institucional no. 2 e à sua liquidação política, resultante da prévia da ARENA para escolha do candidato ao governo de São Paulo.

[Sobre a forma de tratar o então governador de São Paulo, note-se que nesta matéria, após sua cassação, seu nome foi finalmente escrito por extenso, mas, propositalmente, simplificou-se o “Adhemar” da certidão de nascimento por “Ademar”.]

A respeito da situação política paulista, ainda, soube-se que as autoridades federais já haviam tomado conhecimento do “esquema financeiro” com o qual o sr. Ademar de Barros, comprando votos de parlamentares, pretendia derrotar o sr. Abreu Sodré [candidato do Palácio do Planalto e então presidente da Assembléia Legislativa pela Arena, o partido oficial do regime] nas eleições indiretas [pela Assembleia Legislativa, e não pelo povo] do governador paulista.

Tal fato, por sinal, em muito contribuiu para a decisão do governo federal com relação ao ex-governante de São Paulo. 

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Reprodução do título do original da matéria publicada © Reprodução

Corrupção

As áreas revolucionárias da Capital destacaram que a cassação do mandato do sr. Ademar de Barros evidencia o propósito firme do governo de não admitir corrupção por parte de quem quer que seja, principalmente no que se refere aos chamados “testamentos políticos” de governadores estaduais. Comentou-se, a esse respeito, que os governos estaduais da Bahia [chefiado por Lomanto Júnior, ex-UDN e na época integrado à Arena, o partido oficial do regime] e do Estado do Rio [a cargo do governador Badger da Silveira, egresso do PTB do deposto presidente João Goulart e então filiado ao MDB] estariam constituindo objeto de investigações do governo federal. [O baiano Lomanto Júnior, sob suspeita de suposta corrupção, foi poupado, mas o fluminense Badger da Silveira seria cassado em setembro desse mesmo 1966 por suposta e nunca comprovada “subversão].

(Reportagem de Ricardo Setti, de Brasília, publicada no jornal O Estado de S. Paulo a 7 de junho de 1966 sob o título original de ‘Revolucionários de Brasília eufóricos)

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