O corredor principal da prisão: cada detento em sua cela, nada de rádio, TV, jornais ou revistas e banhos de sol em grupos de 5, conduzidos algemados (Foto: @Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de S. Paulo)

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Cada detento sozinnho em sua cela, com porta de aço blindado, vidro blindado protegendo as grades externas, móveis e paredes de concreto maciço e placa grossa de aço sob um metro de concreto no chão. Não há contato físico com visitas, e nada de visitas íntimas (Foto: @Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo) (Foto: @Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo)

Os bandidos perigosos encarcerados no Centro de Readaptação Penitenciária (CRP) de Presidente Bernardes, encravado a 3 quilômetros dessa cidadezinha de 20 mil habitantes a 580 quilômetros de São Paulo, no extremo sudoeste do Estado, acabam de receber o que é, nas circunstâncias, um presentão: tiveram um acréscimo de 50% em seu período de banho de sol e exercícios fora das celas. Agora, ele passou de uma hora por dia para uma hora e meia.

Nas outras vinte e duas horas e meia de um por um dos 365 dias do ano, porém, os sentenciados permanecem reclusos em suas celas individuais. Ali, a vida é dura: as paredes de cada cela são de concreto maciço, não há mobiliário –a cama tem sua base também de concreto –, como sanitário há um orifício no chão provido de descarga e, além dele, os confortos existentes são uma pia e um cano d’água, sem chuveiro, para o banho, invariavelmente frio.

Na janela, uma camada de vidro temperado à prova de bala e, por fora, grades. Nada de televisão, nada de rádio, nada sequer de revistas e jornais. Lazer, só livros da biblioteca da penitenciária, escolhidos a partir de uma lista feita circular entre os detentos.

No banho de sol, quem quiser se exercitar pode andar, correr ou escolher algum outro tipo de atividade, desde que prescinda de qualquer equipamento esportivo, inclusive bola de futebol, que é proibida. Para a saída ao pátio, os detentos, em grupos de cinco, saem – um por vez – algemados das celas. Os grupos de cinco têm sempre os mesmos integrantes, para evitar que haja comunicação entre diferentes facções ou entre diferentes hierarquias.

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Visão geral do presídio, denominadoCentro de Reabilitação Penitenciária Presidente Bernardes: superior em segurança a todos os presídios federais de segurança máxima (Foto: @Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo)

Tudo isso se justifica pelos hóspedes que o Centro de Readaptação acolhe: de suas 160 celas individuais, 95 das quais ainda vazias, 65 estão preenchidas com o grosso dos cabeças e outros integrantes importantes do chamado Primeiro Comando da Capital, o PCC, “partido” de delinqüentes que abriga assassinos, traficantes de drogas e outros criminosos de alta periculosidade responsáveis, no ano passado, pela maior rebelião coletiva de presídios da história do sistema carcerário brasileiro, que se alastrou por 29 estabelecimentos no Estado de São Paulo.

A rotina pesada de Presidente Bernardes decorre, além das características do presídio, do regime a que estão submetidos os presidiários – o temido RDD, ou Regime Disciplinar Diferenciado. Segundo resolução da Secretaria, esse regime “é aplicável aos líderes e integrantes das facções criminosas, bem como aos presos cujo comportamento exija tratamento específico”. Bandidos de alto calibre tremem ao ouvir falar das três letrinhas. A resolução determina que é de 180 dias o tempo máximo de permanência nesse regime, mas isso “na primeira inclusão”. A partir da segunda, o prazo já sobe para 360 dias. Para estimular o bom comportamento, a regra dispõe que qualquer “fato grave devidamente comprovado” de responsabilidade do preso sob o RDD faz com que ele continue debaixo das regras do regime.

Quanto às instalações, a disposição do governador Geraldo Alckmin (PSDB) de tratar com “mão de ferro” o crime foi que levou a Secretaria de Administração Penitenciária a conceber e construir o CRP de Presidente Bernardes, inaugurado em abril passado. Outros virão. Por uma série de dispositivos que transformam em piada o conceito de “presídio de segurança máxima” de Bangu-I, no Rio, essa unidade é efetivamente de segurança máxima, fazendo lembrar os presídios Supermax americanos, apresentados há algum tempo ao leitor brasileiro em matéria do jornalista Elio Gaspari.

Para impedir que se cavem túneis, por exemplo, o piso das celas é de concreto com 1 metro de espessura, sendo que a laje ainda tem, no meio, uma grossa chapa de aço. As muralhas de proteção alcançam 7 metros de altura e 3,5 metros de profundidade. A protegê-las, quatro torres com guardas armados. Um total de 27 câmeras de vídeo prescrutam todos os recantos do presídio, por dentro e por fora. Cabos de aço estendidos sobre o pátio impedem eventual aterrissagem de helicópteros. Os bloqueadores de celulares ali instalados são tão eficientes que não se limitam a informar “fora de serviço” a quem tenta acionar um telefone na área do presídio: ligado o aparelho, em poucos minutos sua bateria está descarregada.

Para a atual população carcerária de 65 detentos há 100 guardas penitenciários. Eles são treinados pela Secretaria da Administração Penitenciária e também por especialistas da Tropa de Choque da Polícia Militar em técnicas que incluem defesa pessoal, revista, imobilização, condução de presos, utilização de algemas, invasão de celas e lida com cães. Por falar nisso, e por via das dúvidas, 6 cães rotweiller e pastores alemães adestrados rosnam pelas dependências do Centro, colaborando na vigilância. Os guardas e outros funcionários têm acompanhamento psicológico à disposição, via convênio, com a Faculdade de Psicologia da Universidade do Oeste de São Paulo (Unoeste), na vizinha cidade de Presidente Prudente.

A segurança máxima inclui zelo absoluto em matéria de visitas: uma vez por semana, por no máximo duas horas, limitadas a duas pessoas, que precisam ser parentes próximos do detento (filhos, irmãos, pai e mãe) ou, então, esposa ou companheira – mas nada de visita íntima. Não há contato físico durante as visitas, feitas num parlatório especial: preso e visitante ficam separados por uma grade com tela. As visitas de advogados se dão em parlatório à parte, onde é ainda menor a possibilidade de contato físico: o advogado fica separado do cliente por um vidro blindado, e a comunicação se dá por interfones.

Uma importante novidade: ao contrário do que ocorre na grande maioria dos presídios brasileiros, os advogados – que, por prerrogativa profissional, não podem ser revistados – são submetidos ao detector de metais, como todas as pessoas que têm acesso ao presídio, incluindo funcionáros. “Muitos questionam”, conta a NoMínimo o diretor do CRP, Antonio Sérgio de Oliveira, que, porém, lembra: “Em aeroporto ninguém entra na sala de embarque sem passar por um detector, não é mesmo? Imagine aqui, então”.

Por essa e por outras é que a gestão do dr. Antonio Sérgio possui o que um recorde nacional: desde que foi inaugurado o CRP de Presidente Bernardes, ele não teve que lidar com qualquer rebelião nem com uma única tentativa de fuga.

(Reportagem de Ricardo Setti, de São Paulo, publicada a 26 de dezembro de 2012 no extinto site www.nominimo.com.br sob o título original de “No interior de SP, cadeia exemplar”. A reportagem seria depois reproduzida, com direitos autorais pagos ao site, pelo Jornal do Brasil)

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