Jair Bolsonaro tomou posse hoje como o 38º presidente da República, depois de derrotar em segundo turno o candidato da coligação liderada pelo PT, o ex-ministro da Educação Fernando Haddad, com 55,7 milhões de votos (55,13% do total) contra 47 milhões (44,7%) do adversário.
Em seu discurso de posse, que fugiu do tom belicoso da campanha, prometeu que seu governo será “defensor da Constituição, da democracia e da liberadade”. Como todo presidente eleito, não obstante eu pessoalmente não concorde com suas ideias quase sem exceção, cabe conceder a Bolsonaro um crédito de confiança. Vamos ver como atua para, então, julgar.
Seu currículo e sua trajetória não permitem que se espere muito, ou quase nada. Capitão do Exército virtualmente expulso da corporação por uma comissão de três coronéis que se encarregou do caso — um suposto plano terrorista que incluía dinamitar o sistema de captação de água do Guandu, no Rio, entre outras ações de protesto contra os salários dos militares –, e só escapou por um julgamento controvertido no Superior Tribunal Militar, que o absolveu por 7 votos a 4.
O pé atrás para com o novo presidente inclui uma série de ações e declarações feitas ao longo de uma longa e medíocre carreira como deputado federal — quase 30 anos em que pertenceu ao chamado “baixo clero” da Câmara dos Deputados e nunca se distinguiu por qualquer projeto ou ação relevante.
Além disso, inclui também uma série de comportamentos que distoam fortemente com alguém que pudesse ter apreço pela democracia:
- Declarou-se mais de uma vez, em alto e bom som, ser favorável à tortura como forma de obter informações;
- Defensor do golpe militar de 1964, lamentou que os militares no poder não tivessem fuzilado “umas 30 mil pessoas”;
- Em 1999, declarou que o Presidente Fernando Henrique Cardoso deveria ser “fuzilado’ em fazão de sua política de privatização de estatais. Na campanha eleitoral do ano passado, Bolsonaro defendeu as privatizações;
- Em 2013, durante discussão no Salão Verde da Câmara dos Deputados com a deputada Maria do Rosário (PT-RS), Bolsonaro disse jamais a estupraria porque ela não merecia ser estuprada, por “ser feia”;
- Repetiu a mesma ofensa em discurso no plenário no final do ano seguinte, e só pediu desculpas cinco anos depois, já como presidente, por determinação da 8ª Vara Cível de Brasília, na qual fora processado pela deputada, decisão mantida pelos desembargadores do Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Ainda pagou multa de 10 mil reais a Maria do Rosário;
- Dedicou seu voto favorável ao impeachment da presidente Dilma Rousseff, no dia 17 de abril de 2016, homenageando uma das figuras mais soturnas do regime militar, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, conhecido torturador, que teria torturado também a então presa política Dilma e a quem Bolsonaro declarou ser “o terror de Dilma Rousseff”.
A enumeração de outras aberrações ditas ou praticadas por Bolsonaro poderia continuar, mas creio que o que está acima basta para imaginar um futuro nada risonho para o país em seu governo. Só que, além desses elementos, há o fato de que Bolsonaro não tem nenhuma experiência administrativa, desconhece os fundamentos da economia, ignora a política externa, e, longe dos grandes problemas reais do país, mostra-se preoupado com a chamada “guerra cultural” – combater o casamento gay, o ensino dos fundamentos da reprodução humana nas escolas, quaisquer tentativas de estabelecer uma política mais construtiva em relação a drogas e por aí vai.
Ainda assim, merece um crédito de confiança. Mas não acredito que se afaste das linhas gerais que já traçou em sua trajetória. Deus nos ajude.