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        BRASÍLIA, 28 – O general Riograndino Kruel [diretor-geral do Departamento Federal de Segurança Pública, que se tornaria no futuro a Polícia Federal], em entrevista coletiva concedida hoje nesta Capital, disse que, além da [cidadã] brasileira e dos cinco norte-americanos que confessaram sua participação no contrabando de minérios atômicos para os Estados Unidos, há outras pessoas implicadas, inclusive “importantes figuras brasileiras”, cujos nomes não quis revelar.

         O diretor-geral ((…) admitiu que “há muita gente envolvida” no caso, mas alegou que a divulgação de pormenores prejudicaria as investigações. Adiantou, entretanto, que os agentes federais procuram vários estrangeiros, entre os quais [os cidadãos norte-americanos] Roy Mason, Jack Hannah, Fred Scott, Fred Droldt e mais outros dois, aos quais chamou apenas de Bruner e Troil.

         Quadrilha confessa tudo

         Os cinco norte-americanos e a brasileira que se encontram detidos na Capital Federal, segundo o general Riograndino Kruel, confessaram que faziam contrabando de minérios atômicos para os Estados Unidos. Revelaram que a próxima partida seria pelo avião B-26 [bombardeiro da II Guerra Mundial convertido em aeronave civil] ora retido no aeroporto de Brasília.

         O aparelho, conforme disseram no depoimento, iria transportar para os Estados Unidos cerca de oito toneladas de tantalita [a principal fonte de tântalo, um metal raro com alta resistência ao calor e à corrosão, que se usa em eletrônicos, na indústria aeroespacial, de defesa, médica e química]. O carregamento desse minério de alto teor atômico destinava-se à firma norte-americana Fansteel Corporation, de Muskogee, em Oklahoma. As remessas seriam feitas em duas viagens mensais com o B-26 detido.

         Organização

         Revelou o general Riograndino Kruel que já se encontra praticamente apurada a organização da quadrilha. Os contrabandistas operavam na Guanabara, Brasília e Minas Gerais. Neste último Estado, atuavam junto à extração de minério em São João D´El Rey, Três Marias e Três Pontas. Mantinham um escritório no Rio, instalado num apartamento em Copacabana, de propriedade do [cidadão] americano Ralph Dial e da brasileira Wilma Konetine.

         Quanto ao montante do dinheiro aplicado no contrabando, o diretor do DFSP disse apenas que Sam Sexton Jr. [ex-político nos EUA e um dos principais implicados] empregou inicialmente 40 mil dólares, tendo um médico, cuja identidade permanece em sigilo, gasto também somas elevadas.

         Os contrabandistas haviam estocado aproximadamente 70 mil toneladas de magnetita na cidade de Entre Rios, [na Bahia]. O estoque foi comprado por somente 24 milhões de cruzeiros, quantia bastante inferior à metade do preço cobrado no mercado. [A magnetita é um mineral composto por óxido de ferro, reconhecido por seu forte magnetismo natural. É utilizada na produção de ferro, aço e outras ligas metálicas e ainda serve a outras finalidades.]

 
        Bilateral

         Os norte-americanos não faziam apenas contrabando de minérios. Cada avião que conduzia uma remessa voltava, regularmente, carregado com uísque, cigarros e rádios de pilha. O material contrabandeado dos Estados Unidos era vendido ou distribuído entre os garimpeiros e intermediários.

         O general Riograndino Kruel desmentiu, entretanto, que organismos oficiais norte-americanos participassem do contrabando, pois as operações vinham sendo feitas exclusivamente por empresas particulares.

         Desmentiu também que a ex-atriz do cinema mudo Joan Lowell, ex-“partner” de Charles Chaplin [no filme A Corrida do Ouro, de 1925], estivesse envolvida. Radicada em Brasília, Lowell apenas serviu de intérprete no início das investigações.

(Matéria de Ricardo Setti,  de Brasília, publicada no jornal O Estado de S. Paulo em 1º de março de 1966 sob o título original “Contrabando era de vulto”)

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