policial-pede-habeas-corpus

5 junho 1966

Já deram entrada no protocolo do Tribunal de Justiça do Distrito Federal dois pedidos de “habeas corpus” em favor do delegado Egberto Assunção, preso há dias por ordem do general Riograndino Kruel, diretor geral do Departamento Federal de Seguraça Pública [DFSP, precursor da Polícia Federal] e destituído da chefia do Serviço de Diligências Especiais do órgão. O delegado Assunção está implicado no desaparecimento do grego Hipocratis Takapoulos, acusado de haver cometido crime de estelionato ao adquirir um diamante de 450 quilates (chamado “diamante 007”) dando em pagamento dois cheques sem fundo de 2 bilhões de cruzeiros cada.

Enquanto isso, a colônia grega de Brasília, notadamente os membros residentes no Núcleo Bandeirante, estão-se arregimentando para pedir ao general Riograndino Kruel a punição de todos os envolvidos no desaparecimento de Hipocratis.

O recurso

O advogado de Hipocratis acha que os “habeas corpus” não poderão surtir efeito, pois segundo o art. 141, parágrafo 23, da Constituição, não cabe a medida quando se trata de transgressão disciplinar. Na prisão do delegado Assunção, ordenada pelo general Riograndino Kruel, não foram atendidos os requisitos que caracterizariam prisão por transgressão disciplinar, que foi a versão apresentada por alguns porta-vozes do DFSP para a medida adotada contra o delegado.

Com efeito, não houve qualquer sindicância prévia que apurasse, ainda que sumariamente, a culpa do delegado. Este não foi notificado, pública ou reservadamente, sobre sua prisão, e tampouco tomou conhecimento prévio dos motivos da medida e do tempo em que ficaria detido.

Ademais, o delegado não foi recolhido a uma dependência do DFSP, como prevê o Estatuto do Policial para ocupantes de cargo de chefia, estando preso, incomunicável, no quartel da Polícia do Exército. A medida drástica adotada pelo diretor-geral do DFSP tem levado às mais diversas cogitações sobre a culpa do delegado Assunção, havendo, inclusive, quem acredite que o policial haja eliminado o grego Hipocratis.

Comissão

O DFSP continua se omitindo em prestar qualquer informação sobre o caso, acreditando-se que o delegado Egberto Assunção vá depor perante a comissão de inquérito sobre o desaparecimento do grego na próxima segunda ou terça-feira. A comissão, como se sabe, foi instituída anteontem pelo general Riograndino Kruel para apurar o paradeiro de Hipocratis, após seu advogado, Inezil Penna Marinho, ter entrado com representação junto à Corregedoria do DFSP para saber onde, realmente, se encontrava o [cidadão] grego.

A representação do advogado foi motivada pelo fato de ter o DFSP informado ao Supremo Tribunal que Hipocratis havia fugido e se encontrava em lugar incerto e não sabido, ao instruir um pedido de “habeas corpus” que havia sido impetrado junto na Corte em favor do cliente. O DFSP, para informar ao STF, havia-se baseado no relatório do delegado Assunção sobre a suposta fuga, até hoje não comprovada, de Hipocratis. Acredita-se, por isso, que a prisão do delegado tenha como motivo inicial o fato de ter ele prestado falsas informações à diretoria do DFSP, para que esta instruísse o “habeas corpus” impetrado pelo advogado de Hipocratis junto à Suprema Corte. Entretanto, nada há de oficial, pois as autoridades policiais têm silenciado sobre o assunto.

Reportagem de Ricardo Setti, de Brasília, publicada no jornal O Estado de S. Paulo a 5 de junho de 1966 sob o título original de “Policial pede ‘habeas-corpus’)

DEIXE UM COMENTÁRIO

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *