O presidente do MDB, senador pelo Acre e general da reserva Oscar Passos, formalizou aos presidentes do Senado e da Câmara as apreensões da oposição diante da denúncia contida em um documento sôbre a constituição de um grupo terrorista na Aeronáutica. Êsse documento, anexo à carta de um brigadeiro, foi objeto de uma reunião, na noite de anteontem, no gabinete do senador Gilberto Marinho [da Arena-GB e presidente do Senado], de que participaram o presidente da Câmara, José Bonifácio [Arena-MG], o senador Oscar Passos, o líder Mario Covas [MDB-SP], o vice-líder do govêrno na Câmara, Cantídio Sampaio [Arena-SP], o líder da oposição no Senado, Aurélio Viana [MDB-GB], o vice-líder governista Manoel Vilaça [Arena-AL], o deputado Djalma Marinho [ARENA-RN], presidente da Comissão de Justiça da Câmara, o secretário-geral do MDB, Martins Rodrigues [CE], o vice-líder oposicionista Edgar da Mata Machado [MG] e o senador Mário Martins [MD-GB]. Os presidentes do Senado e da Câmara viajaram ontem para o Rio – tendo o sr. José Bonifácio, por sinal, contrariado sua rotina – com o objetivo de entregar ao presidente da República o documento e a carta do brigadeiro contendo a denúncia sobre o Para-Sar [Serviço de Buscas e Salvamentos da FAB, que seria encarregado de fazer desaparecer opositores do governo]. As informações sobre o conteúdo do documento são de fontes arenistas altamente responsáveis. O MDB, diante da gravidade dos fatos, comprometeu-se a não lhe dar divulgação, das tribunas ou fora delas. Os oposicionistas, aliás, têm-se mantido em discrição exemplar, num mutismo incomum. O presidente Oscar Passos, por exemplo, chegou a negar aos jornalistas que tivesse conhecimento, sequer, da denúncia feita pelo deputado Maurilio Ferreira Lima [MDBPE], segundo a qual estaria sendo preparado, neste Serviço de Buscas e Salvamentos da FAB – Pára-Sar – um grupo com o objetivo de eliminar líderes políticos. Por outro lado, chegou às mãos do senador Mário Martins, há alguns dias, um documento apócrifo, em que uma organização que se denomina Macaer – Movimentos Anticomunistas da Aeronáutica – faz diversas acusações ao ministro da Aeronáutica, o marechal-do-ar Márcio de Sousa Mello. O senador recusa-se a exibir o documento à imprensa.
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Fragmento da matéria publicada © Reprodução
A oposição está preocupada e deverá manter hoje diversas reuniões para exame da situação. O MDBaguarda uma atitude do presidente da República, e quer garantias de que os fatos serão apurados em sua totalidade. Enquanto isso, vai ficar em silêncio.  O gabinete do ministro da Aeronáutica distribuiu ontem nota oficial, desmentindo as informações sôbre a constituição de um grupo terrorista na FAB. Estas informações foram divulgadas anteontem pelo deputado Maurílio Ferreira Lima, e ontem, por fontes responsáveis da Arena. “O gabinete do ministro da Aeronáutica” – diz a nota – “informa que o recente noticiário envolvendo, desprimorosamente, a Fôrça Aérea Brasileira, não expressa a verdade, uma vez que tudo se limita à aplicação de medidas de caráter estritamente disciplinar, que não teriam ultrapassado o âmbito da FAB, não fôsse a distorção deliberada ou interêsse espúrio de tumultuar o assunto. “Não houve, em nenhuma eventualidade, a hipótese da utilização de quaisquer elementos da Aeronáutica em missões não compatíveis com a dignidade militar e os preceitos legais. “A insinuação da existência de um ambiente de crise, que absolutamente não corre, representa uma manobra divisionista em ofensiva dirigida contra as próprias instituições militares, fazendo parte dos processos de tentativa de isolamento das Fôrças Armadas na comunidade brasileira”. [A denúncia, gravíssima e tratada com luvas de pelica pela oposição e com mentiras por parte do governo, era fundamentada e a história identificaria seus principais promotores, a partir do brigadeiro João Paulo Burnier, conspirador contra a democracia desde o governo de Juscelino Kubitschek. Denunciado formalmente pelo capitão-aviador Sérgio Miranda de Carvalho, o “Sérgio Macaco” que, fora convidado pelo brigadeiro para fazer parte de seu projeto, o caso foi investigado pelo brigadeiro Itamar Rocha, que recebeu apoio de 300 oficiais da Aernáutica, mas Burnier não sofreu punição alguma e ainda foi promovido ao longo da carreira. Sérgio “Macaco” não teve mais qualquer chance na carreira e por muitos companheiros era visto como maldito. Sem provas absolutamente concluvivas, o grupo chegou a ser  reaponsabilizado por mortes e desaparecimentos de pessoas críticas ao regime. O patrono e eterno herói da Aeronáutica, brigadeiro Eduardo Gomes, disse de Burnier, morto no ano 2000, aos 81 anos, que  se tratava de “um insano mental inspirado por instintos perversos e sanguinários, sob o pretexto de proteger o Brasil do perigo comunista”.] (Artigo publicado por Ricardo Setti, de Brasília para o Jornal da Tarde, de São Paulo, a 4 de outubro de 1968, sob o tímido título feito pela Redação em São Paulo de “A incrível denúncia”)

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