CAMPOS DO JORDÃO (SP) – As empresas alemãs que operam no Brasil estão preocupadas com o futuro. Não se trata de um sentimento negligenciável: o capital alemão só é superado pelo norte-americano no quadro dos investimentos estrangeiros no Brasil. A Alemanha é o terceiro maior comprador de produtos brasileiros no exterior – depois dos Estados Unidos e do Japão – e as mil empresas que, no país, têm participação de investimentos alemães dão emprego a um exército de 280 mil brasileiros.

O desconforto inclui questões práticas, como certos procedimentos considerados restritivos, no âmbito do Banco Central, à remessa e lucros, mas adquirem tom político na medida em que abrangem a insegurança quanto ao estabelecimento de reservas de mercado na economia, a forma pela qual o país está renegociando a sua dívida externa e, mesmo, a incerteza sobre o tipo de modelo econômico a ser adotado pela futura Assembléia Nacional Constituinte.

Mais que um mero estado de alma, essa preocupação já bate duro nas contas nacionais, refletindo-se, por exemplo, nos 287 milhões de dólares de capitais alemães repatriados no primeiro semestre deste ano – contra 262 milhões em todo o ano de 1985 – e, mais ainda, na decisão alemã de trazer dinheiro novo para investir no Brasil. É possível que um bilhão de dólares que seriam injetados este ano na economia do país estejam reduzidos a zero quando se fizer o balanço dos investimentos que ingressaram no país no curso de 1986.

Expectativas e cifras como essas vieram à tona no seminário “República Federal da Alemanha, parceiro econômico para o Brasil”, promovido para um pequeno grupo de jornalistas no último fim de semana num hotel em meio às verdejantes montanhas deste município, a 172 quilômetros de São Paulo, na região da serra da Mantiqueira, pela Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Alemanha. Entidade privada com sete décadas de atuação no Brasil, a Câmara reúne mais de 800 empresas, não só de capital alemão, e é um termômetro confiável e tradicional de parte do comércio exterior brasileiro. 

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Reprodução da matéria pubicada no jornal © Reprodução

Seu gerente-geral adjunto e chefe do departamento econômico, Horst Brendel, admitiu francamente que “as eleições para a Constituinte levam o capital estrangeiro a adiar decisões de investimento até conhecer melhor os rumos políticos e econômicos que serão adotados. Nós não sabemos em que condições econômicas as empresas vão poder trabalhar ou não”. O próprio cônsul-geral adjunto da República Federal da Alemanha, Hans-Georg Fein, chefe do departamento econômico do consulado, concordou em que a indefinição sobre o modelo político e econômico a ser adotado no Brasil “de fato é uma preocupação muito grande entre os empresários alemães, em razão da insegurança quanto ao papel do capital estrangeiro no futuro”.

Segundo Brendel, uma pesquisa feita em maio apenas entre as 17 maiores empresas alemãs instaladas no Brasil revela uma intenção de investimento de 3,7 bilhões de dólares nos próximos cinco anos. Esta cifra poderia chegar a 5 bilhões de dólares se fosse considerado o universo completo do capital alemão no país – com a ressalva de que o dinheiro viria “sob condições favoráveis”. Desse total, um bilhão pingaria este ano – não fosse o quadro político do pós-cruzado e da pré-Constituinte.

Em vez de novos investimentos, o saldo do fluxo de dinheiro alemão este ano deve ser negativo, como já foi em 1985. “Há coincidência entre o começo da discussão da reserva de mercado na informática e a queda nos investimentos alemães, que são mais vinculados a áreas de tecnologia, onde a informática tem papel importante”, disse Brendel. De fato, a julgar pelas estatísticas: em 1971, quando a reserva de mercado era apenas uma meta a ser atingida pela então recém-criada Secretaria Especial de Informática, os alemães investiam 731 milhões de dólares no Brasil.

A cifra cairia para 602 milhões no ano seguinte, para 528 milhões em 1983 e desabaria para 130 milhões em 1984, antes de tornar-se negativa (69,2 milhões) no ano passado. Brendel, porém, não se ateve à informática, citando como exemplos “preocupantes” de uma “tendência a criar reserva de mercado” os setores de cargas aéreas, máquinas agrícolas e telecomunicações.

(Reportagem de Ricardo Setti, de Campos do Jordão (SP), publicada originalmente no Jornal do Brasil)

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